Relato de parto: Gabi, Felipe e Dalia
O Relato de Parto hoje está incrível!! A Gabi teve seu parto no Hospital Sofia Feldman, uma maternidade pública localizada em BH que atende pelo SUS, considerada hospital modelo e referência internacional em atendimento humanizado e de partos naturais.
Um relato emocionante feito para a filha, cheio de detalhes e surpresas!! Confira:
"Querida filha,
Estou há semanas procurando um momento para escrever meu relato sobre o seu nascimento, mas desde que você chegou ao mundo precisava de um tempo para assimilar tudo... Agora, passado três meses, acho que chegou o momento de contar tudinho pra você. Quero registrar a história de como te conheci para que um dia você possa ler e para que eu possa sempre lembrar a mulher incrível que fez tudo aquilo para trazer você ao mundo.
Desde o primeiro dia que soube estar grávida, sabia que tinha preferência por ter um parto natural, ou seja, um parto com o mínimo ou sem nenhuma intervenção. Como não conhecia muito sobre o assunto, precisei me informar bastante para entender do que se tratava a escolha que estava fazendo. Assim me tornei “a louca” das pesquisas e rodas de gestante! Aliás, o seu papai conseguia ser ainda mais louco que eu, mas isso é outra história. A leitura dos relatos de partos que chegavam até mim, as conversas nas rodas e nos grupos virtuais sobre maternidade me ajudaram a ter uma ideia de como seria parir e, mais do que isso, de como seria ter um parto natural.
Minhas pesquisas me apresentaram um mundo completamente novo! Havia sido a primeira vez na vida que olhava para o corpo feminino daquela maneira tão misteriosa! E, ao contrário de tudo que imaginava, parir não é o fim do mundo! Uma mulher em trabalho de parto pode ficar assim por dias sem que isso signifique correr para o hospital… Me impressionou ver como em nossa sociedade não estamos habituados a ver mulheres em pleno trabalho de parto no dia a dia, quando é exatamente isso que acontece: esbarrar com uma gestante no elevador e, de repente, lá estar ela tendo suas contrações espaçadas tranquilamente...
Sempre me disseram que na primeira gestação o corpo demora mais para entrar em trabalho de parto, por isso contava que você nasceria lá pela 39a semana adiante… Na maioria dos relatos que li, as mamães tinham seus bebês já em idade gestacional avançada, o que as levava a usar e abusar de banhos de banheira, chás e escalda pés, tudo para tentar “induzir” o corpo a entrar em trabalho de parto. Não via a hora de poder começar a fazer o mesmo quando chegasse o momento. Tudo isso me chamou muito atenção na época, pois me parecia uma informação diferente daquela dos partos agendados de nove meses, prescritos a partir da disponibilidade do obstetra não-humanizado...
Mas enfim, estou contando isso só para dizer que essa informação muito me preparou para a espera. Ainda que uma pulguinha atrás da orelha me dizia que você não iria demorar muito para nascer… considerar a rapidez com que engravidei de você, sempre tive um pressentimento que você seria um serzinho de luz muito animado para vir logo ao mundo!
Parte 1
Os primeiros sinais
Estava com 36 semanas de gestação quando, ao ir ao banheiro, vi um pequeno muco avermelhado sair de dentro de mim. Fiquei parada olhando para o muco quando me veio à mente as palavras de uma gestante que, dias antes, em um curso de Casal Grávido (esse curso é oferecido todo mês, gratuitamente, pelo Hospital Sofia Feldman para casais em idade gestacional acima de 27 semanas) comentou algo sobre uma coisa chamada “tampão mucoso”.
Um pouco em dúvida se era esse o nome mesmo, fui imediatamente ao Google! Vi fotos e li em diferentes sites que aquilo era indicativo de um possível início de trabalho de parto… Fiquei assustada. Para aumentar meu espanto, naqueles dias também senti um pouco de corrimento líquido e incolor na calcinha que persistiu por uns dias… Nunca fui de muito alarde. Toda minha gestação foi tranquila e saudável, mas naquele momento vi que era necessário conversar com seu papai sobre esses sinais poderem significar algo mais sério, assim decidimos ligar para Dr Lucas Barbosa e mandar mensagem pra Lena (o médico obstetra e a doula) para sabermos melhor.
No dia seguinte, uma segunda-feira, falamos com Dr. Lucas pelo telefone e ele nos disse que não necessariamente esses sinais se tratavam de indicativo de trabalho de parto, mas que seria interessante ele me examinar. Como não era nada urgente, ele mesmo sugeriu que eu esperasse para fazer a consulta na quarta-feira à noite no Hospital Sofia Feldman, quando ele estaria de plantão e poderia me examinar.
A quarta-feira, dia 14 de junho, foi um dia normal para mim, como qualquer outro. Estávamos em final de obra na nossa casa e passamos o dia cuidando dos últimos detalhes - exatamente neste dia o seu quarto, finalmente, terminava de ser pintado! Naquele dia trabalhamos duro nos últimos retoques e fizemos até uma pequena faxina na casa antes de viajar. Lembro apenas de sentir minha barriga mais pesada durante todo o dia, já andava igualzinho um pato naquela altura... Ainda assim, estava bastante calma, sem nenhuma ansiedade ou medo, sabia que, apesar dos sinais o parto só aconteceria daqui a pelo menos duas ou três semanas, como previsto. Estava muito bem disposta e animada naquele dia!
Finalizei a faxina na casa. Tomei um banho, fiz a mala para uma noite em BH (moramos numa fazenda em outro município), comemos um lanche rápido e saímos de casa por volta das 18h. Recordo que foi uma viagem de 2 horas super agradável! Seu papai e eu conversávamos bastante e nem vimos o tempo passar... Foi uma das poucas vezes que nem lembramos de colocar música no carro, pois o assunto estava tomando conta do silêncio e estávamos especialmente felizes naquela noite… parece até que sabíamos o que estava por vir, não é?

Parte dois
“Uma viagem em alto mar: Terra a vista!”
Chegando no Jardim Canadá, resolvemos fazer uma parada para tirar dinheiro. Felipe estacionou o carro e eu mesma fui ao banco sacar no caixa eletrônico. Ao retornar ao carro e abrir a porta, escutei um pequeno barulho dentro de mim: ploft! Senti minhas pernas encharcadas como se tivessem me jogado um balde de água. A bolsa havia estourado? Mas como?? Obviamente não acreditamos no que estava acontecendo e tive que ter certeza ligando para minha doula*, Lena, que após me ouvir, afirmou calmamente que sim, era a bolsa estourada!
*Doula é uma pessoa especializada em partos que é contratada para acompanhar a gestante durante toda a gestação, o parto e até mesmo no pós-parto. Ela fornece informação atualizada, tira dúvidas e trabalha oferecendo grande apoio emocional e orientações técnicas para a mulher e o casal.
A caminho do Hospital - onde, inclusive, já estávamos indo… -, comecei a sentir uma vontade incontrolável de fazer xixi, parecia que não tinha controle nenhum sobre minha bexiga! Pedi pelo-amor-de-Deus para o seu papai parar o carro para eu fazer xixi no acostamento. E por incrível que pareça ele parou! Não podia acreditar que estava fazendo xixi atrás do carro, num trânsito de início de feriado de Corpus Christi, com aquela barriga enorme e você podendo nascer ali... OK… isso não aconteceu, ufa!
Então, de volta ao carro, continuamos em direção ao Sofia Feldman. De onde estávamos levamos cerca de uns 30 minutos para chegar, o que para nós era o melhor dos mundos, se pensarmos que poderíamos estar na fazenda a cerca de 140km do hospital! Neste caso, sim, havia a possibilidade de você nascer na estrada!
No caminho para o hospital falei com dr. Lucas para confirmar que estava indo para o hospital encontra-lo. Isso me deixou bastante tranquila. Ter o obstetra que me acompanhou durante todo o pré-natal de plantão justamente no dia em que você ia nascer foi muita sorte!
No caminho também falei ao telefone com sua madrinha, Julia, para dar a singela notícia de que minha bolsa havia estourado, mas com um senso de humor inapropriado pro momento, cheguei a dizer para ela que ainda tinha esperança de ser apenas uma incontinência urinária muito forte. Claro que ela entrou em pânico!
Bolsa estourada e ainda nenhuma dor? Me perguntava: como é possível? Eu teria que ficar internada em observação para o bebê não entrar em sofrimento? Já tinha ouvido falar que em alguns casos, quando o líquido amniótico “vaza”, a própria cabeça do bebê pode servir de “tampão” bloqueando a saída de todo o líquido, assegurando sua vida ali dentro da placenta. Mesmo assim me bateu aquela preocupação! Fui pega de surpresa e tive medo de não parir naquela noite e precisar ficar internada em observação. Não era o que tinha em mente! Procurei não ficar nervosa antes do diagnóstico do dr. Lucas, pois, seja como fosse, uma coisa era certa, você estava chegando!
Chegamos no hospital por volta das 20h30 e eu com a calça ensopada! A vontade incontrolável de fazer xixi continuava… e claro que fiz xixi no carro algumas vezes e inclusive na recepção do hospital lembro de sentir xixi escorrer por minhas pernas… um pesadelo não é? Ainda bem que numa maternidade as pessoas estão acostumadas com esse tipo de coisa... Mal conseguia preencher a ficha do hospital que o xixi praticamente descia pelas minhas pernas… Será que toda grávida sente isso durante o trabalho de parto? Nunca tinha ouvido falar de uma vontade tão intensa!
Fui ao banheiro da recepção do hospital umas 100 vezes e em uma delas tive uma forte dor de barriga e evacuei bastante ali. Em um momento sentada ainda na recepção, esperando Felipe terminar de preencher a ficha para mim, eis que olho em volta e vejo a Simone, uma doula amiga minha que ministra as rodas de gestantes que participávamos em Conselheiro Lafaiete.
Parecia uma miragem! Chamei por ela e foi muito bom aquele encontro. Ela estava acompanhando outra gestante em situação parecida com a minha, então não pôde ficar muito comigo… contei o que estava sentindo pois não sabia se as contrações estavam começando… ela pôs as mãos na minha barriga e disse “Gabi, você está tendo contrações!”. E eu perguntei assustada: “Estou?”. Para minha surpresa, me vi ciente de que ok, estava começando a ter minhas contrações, mas me sentia relativamente bem já que ainda não eram das mais fortes...

Dr. Lucas aparece na minha frente por volta das 21h e me salva! Como sempre muito calmo e tranquilo, me encaminhou para a sala de ultrassom onde poderia me examinar. Felipe aproveitou para ir até o carro para deixá-lo no estacionamento e pegar uma roupa seca para mim. Dr. Lucas também se ausentou rapidamente (imagino que médico plantonista tenha muitos pepinos para resolver numa maternidade). Na verdade, parece que todos que deviam estar comigo aquela hora desapareceram! Fiquei sozinha por cerca de meia hora ou mais! (Lembro do Felipe ter me contado depois que não chegou a ser tudo isso, mas para mim pareceu uma eternidade!).
Finalmente comecei a realmente sentir aquilo que minha amiga Simone identificou como sendo o começo das contrações, agora entendi do que se tratava. Quando realmente senti, posso dizer que elas honraram a fama que tem. As danadas das contrações vinham bem fortes. Aquela vontade de fazer xixi deu lugar, então, a essa cólica dos infernos!
Nesse meio tempo em que me vi sozinha ali, procurei encontrar uma forma de lidar com as contrações por conta própria. Percebi que vinham bastante regulares, não cheguei a contar o tempo, mas pareciam que estavam vindo de 5 em 5 minutos. Toda vez que aquela dor horrorosa chegava pulsando no baixo ventre, eu me curvava todinha! Ficava em posição de cócoras dando pequenos saltinhos de sapo, a pressão das pernas contra barriga aliviava a dor quase totalmente - domínio do corpo que aprendi no yoga sendo colocado em prática ali!
E claro, junto com a dor, muitos gemidos e gritos nada tímidos! Senti que algum tipo de animal selvagem começava a tomar conta de mim. Virei um bicho. Andava a espreita pelos cantos da sala, abaixava como um animal e grunhia, um olhar focado e distante. Muita concentração. Me concentrei totalmente nas contrações e travei sozinha uma profunda comunicação com elas. A cada dor chegando, sentia minhas entranhas me mandando uma mensagem. Tudo o que aquela dor parecia me dizer era para sair do controle e deixar meu corpo agir, pois tudo que estava acontecendo ali era um chamado visceral da natureza.
Mas ainda doía pra caralho!!!!
Felipe finalmente chega e conta que já ligou para a doula, Lena, e que ela estava a caminho. Ufa! Dr. Lucas também aparece e finalmente me examina. Não lembro exatamente, mas acredito que ele fez um exame de toque em mim. Informou que eu estava com 7cm de dilatação e que eu já poderia ir para a suíte de parto, pois você já estava para nascer!
Me perguntava como poderia já estar com 7 cm se as contrações apenas haviam começado? Não era isso que tinha ouvido falar que aconteceria… foi quando comecei a entender que cada parto é uma verdadeira caixinha de surpresas!
Pedi para o Dr. Lucas fazer um ultrassom pois queria garantir que você estava realmente bem. Eu vi você na tela e ele disse algo tipo: “sim, olha ela ali, está tudo bem! Ela está bem posicionada e pronta pra nascer”. Fiquei tão feliz. Estava realmente muito feliz, mesmo sentindo aquela dor dos infernos. Não sentia nenhum medo, nada. Sentia era muita vontade de seguir em frente!
Quando outra contração chegava me destruindo da cabeça aos pés e testando meus limites… Lembro que desci da maca e fui direto pro chão, agachada, dei um berro de leoa!! Dr. Lucas, com sua voz da experiência, me disse: “muito bom! Esses gritos são mesmo de bebê chegando”. Comecei a rir daquele comentário e até hoje acho muita graça de todas as cenas que envolve meu obstetra maluco e maravilho durante meu parto.
Estava muito emocionada… se aquilo tudo que me acontecia era mesmo real, significava que pulei a parte da espera longa e ansiosa. Estava no chamado “parto relâmpago”. Tudo estava acontecendo exatamente ao contrário de tudo que imaginei ou poderia esperar.
Parte três
“Minha chegada à Partolândia”
A suíte com banheira onde eu teria o parto estava sendo limpa. Dr Lucas escolheu aquele quarto para que eu pudesse parir na água se assim quisesse. Embora não tinha dado tempo de escrever meu plano de parto, certamente parir na banheira fazia parte dos planos… A má notícia era que não poderia ir para Casa de Parto, teria que ficar no hospital, o motivo: você ainda não tinha completado 37 semanas (faltava apenas algumas horas para isso...).
Considerada um bebê prematuro, segundo protocolo médico, o parto só poderia acontecer em ambiente hospitalar. Uma pena, pois a Casa de Parto comparado aos corredores frios e feios de um hospital, seria um lugar muito mais agradável para você nascer! Mas confesso que, quando entrei naquele estado animal, onde estava, se teria banheira e um quarto bonito, não importava! Tudo que me interessava era que você nascesse bem e saudável (só no pós-parto fui sentir falta de estar em um ambiente mais tranquilo e aconchegante... nessa hora lamentei não ter parido na Casa de Parto…).
No corredor do hospital esperei terminar a limpeza do bendito quarto, estava aos berros ritmados de 3 em 3 minutos mais ou menos… Houve um momento em que uma funcionária passa por mim e me dá um pano verde de hospital e diz para eu colocar no meio das pernas caso o bebê caia. “O que?”, pensei. Eu não posso acreditar no que ouvi... Na dúvida, peguei o tal paninho, pois vai que…
Do corredor, me levaram para uma sala qualquer pois a tal da suíte com banheira ainda não estava pronta. Ok. Mais uma espera. Seu papai estava comigo me dando sua mão pra apertar sempre que a dor vinha, ele tentava segurar as ondas, pois eu já começava a entrar em uma fase em que não conseguia falar… No entanto, mesmo querendo ele ao meu lado, naquela altura não tinha nada que ele pudesse fazer por mim, a não ser me passar muito amor, luz e tranquilidade. E isso ele fez muito bem. Lembro dele tentar fazer as tais massagens na lombar que aliviam a dor, mas confesso que no meu caso isso só me irritava… não sentia nenhuma dor na lombar, como geralmente acontece nas contrações.
A dor começa a piorar significativamente. Vomitei de dor. Rolei no chão de dor. Abracei muito forte o seu papai e tentava encontrar uma posição, mas nenhuma parecia amenizar... Deve ser nesse momento que as mulheres pedem analgesia! Mas incrivelmente isso não passou pela minha cabeça em nenhum momento. Não senti vontade de ser medicada, apenas sentia muita necessidade de estar livre para tirar minha a roupa se quisesse, dançar, gritar, gemer e me contorcer, pois sabia que me entregar mais e mais àquele fluxo de energia incontrolável que passava por mim seria o melhor caminho. Entendo que não é fácil e não sei até hoje como consegui!
Em um dos intervalos entre as contrações, caminhei um pouco para ver se a dor aliviava. Felipe me segurava pois não conseguia andar sozinha. Então começo a ter vontade de fazer cocô! “Oh não!”, pensei. Pedi a enfermeira para ir ao banheiro, mas ao ver minha situação, ela me recomendou não fazer isso, pois talvez não era cocô e sim o bebê querendo sair. Realmente, só depois fui perceber que era o que estava acontecendo… e até agora nada de suíte, banheira, conforto, “meia luz” e tudo que pensei ter no meu parto idealizado...
Finalmente chegam as enfermeiras e me levam para a bendita suíte! Fui carregada por elas e pelo papai, estava curvada, não conseguia erguer a coluna. Tudo que via era um corredor e nada mais a minha volta. Senti que não tinha mais nenhuma consciência do todo, estava em um estado de transe que tomou conta de todo meu corpo. Acredito que nessa hora foi quando entrei no que chamam de “partolândia”.

Parte quatro:
“No círculo de fogo”
Ao entrar na suíte vi que a banheira ainda estava enchendo, por isso me perguntaram se queria subir na maca. Acredito que as enfermeiras não faziam ideia de que eu já estava bastante adiantada… balbuciei alguma coisa sobre querer ficar por ali no chão mesmo... Começo, então, a sentir um puxo dentro de mim que não era mais como uma contração, mas uma queimação absurda na região anal e vaginal, parecia uma mão me abrindo ao meio. Senti muita vontade de fazer força, mas não sabia se deveria fazer... Fiquei bastante confusa nesse momento e acho que foi a única vez que senti medo. Nesse momento não era apenas dor que sentia, mas uma enxurrada de energia que invadia todo o meu corpo. Era muito doloroso sim, mas não era uma dor como torcer o pé. Era algo cósmico e energético, entre o prazer e a dor, o céu e o inferno.
Neste exato momento, Lena, minha doula, entra na sala. Ufa! Lembro que ela se abaixou junto a mim no chão e eu disse pra ela “Lena, está muito seco e queimando”. Sentia muita vontade de refrescar a região pélvica (quando entendi porque parir na água deve ser tão bom!). Seu papai estava à minha frente e a Lena ao meu lado. Ambos comigo me apoiando. Digo para Lena que não vou conseguir porque estava doendo demais.
Não sabia o que fazer. Naquela hora acho que entrei em mini-pânico e quis controlar o corpo, controlar o que estava acontecendo... Então, ao invés de deixar você vir calmamente, no desespero acabei fazendo a força que meu corpo parecia pedir... Olhei para Lena e ela disse apenas “deixa sua filha nascer, Gabi”. Foi quando caiu minha ficha que deveria relaxar e não forçar! Deitada de lado no chão, minha saia levantada, relaxei o corpo, fechei os olhos para o desespero que estava me tensionando e me entreguei. Pronto. Você literalmente escorregou para o paninho verde que a enfermeira segurava. Era 22:27. Tudo isso aconteceu em 1h30! Eu e o papai nos olhamos com os olhos arregalados. Olhei pra você ali no chão. Olhei pra Lena e ela disse “viu, nasceu!”.

Filha, a primeira vez que olhei para você, meu primeiro sentimento foi de admiração. Admiração pela sua beleza incalculável, sua perfeição e plenitude. Você materializada na minha frente encheu meu coração de um sentimento novo, “agora sou mãe!”. Ali mesmo no chão, peguei você no colo pela primeira vez. Como estava um pouco assustada com a forma como tudo aconteceu rápido, minha reação foi dizer que não estava preparada para você! Acredita que disse isso? Acho que as enfermeiras riram de mim nessa hora.
Me aplicaram uma injeção com ocitocina para que eu pudesse expelir a placenta e rapidamente ela saiu de dentro de mim. Curioso que expelir a placenta foi parecido com a sensação de você saindo de dentro de mim, mas sem tanta dor, foi bem rápido. E passado tudo isso, já me sentia super bem! Tudo se normalizou a minha volta. Consegui me levantar e subir sozinha na maca carregando você no meu colo. Nem parecia que tinha acabado de passar por tudo aquilo! Que maravilha é um parto natural!
Deitada na maca com você no colo e papai do nosso lado, pedimos às enfermeiras para que ele cortasse o cordão umbilical. Seu papai fez tudo direitinho e colocou intenção de muita luz para seu caminho dali pra frente. Lembro que me mostraram a placenta, mas confesso que não a achei muito atraente e descartei a possibilidade de leva-la para casa. Agora era só eu, você e o papai. Nos abraçamos como uma família pela primeira vez. Você mamou também pela primeira vez e pegou direitinho o peito. Te ver grudadinha em mim mamando foi um momento que eu poderia congelar e ficar admirando para sempre.
Como contei, no momento em que sentia o chamado “círculo de fogo”, isto é, a queimação de você “coroando”, a força que fiz provavelmente me levou a ter lacerações de primeiro grau, que resultaram em alguns pontinhos. Confesso que de tudo o que passei, levar os pontos foi a parte mais chata e difícil!
Diferente do parto em si, a recuperação dos pontos levou mais tempo, não apenas no sentido físico como também no emocional. Mesmo após os pontos caírem me restou uma pequena cicatriz que, pelo visto, ficará ali para sempre. Isto eu ainda tenho dificuldade de assimilar. Quando engravidamos focamos muito em obter algumas informações e esquecemos de outras. Havia lido pouco sobre lacerações num parto natural… um obstetra tradicional iria me indicar ter feito o corte no períneo (corte cirúrgico conhecido como episiotomia), mas havia decidido que não iria fazer isso. Inclusive no hospital onde você nasceu consideram que se for feito como rotina, esse procedimento é violência obstétrica. Mas essa é uma outra discussão que fica para depois… afinal, o que exatamente a episiotomia evita e o que podemos definir como “quando necessário”, são noções muito relativas.
Você nasceu com 2,610 kg, medindo 46,5cm e tirou nota 10 na escala de Apgar, que é o índice que mede os primeiros sinais do recém-nascido. Nada mal para um bebê considerado prematuro! Tivemos que passar dois dias e três noites no hospital totalmente despreparados! Tudo que havíamos comprado para levar para maternidade no dia que você nascesse havia ficado em casa e, comigo internada e seu papai cuidando da gente, não seria possível ir buscar.
Por isso, sua primeira vestimenta acabou sendo uma roupa da caixa de doação do hospital! Nas suas primeiras noites, você dormiu coberta de vernix (substância branca que cobre o bebê no nascimento) dentro do meu vestido e tinha apenas o paninho verde pra te enrolar. Mas toda essa parte pós-parto é uma longa história, vamos deixar para contar uma próxima vez.
Hoje você está com 3 meses e sentimos uma felicidade indescritível. Uma felicidade única, ainda que tudo isso não seja apenas sobre ser ou estar feliz. Com seu parto vi o quanto a natureza de cada um é particular. Embora os conceitos, teorias e experiências de outros nos ajudem a entender melhor o mundo, no final das contas, o que conta é o que está na nossa frente, o aqui e agora, ainda que imperfeito, fora do planejado, inesperado. Assim foi seu parto não-idealizado, real e mágico. Não tive a banheira, velas, mantras relaxantes e incensos que tanto sonhava… mas foi meu parto, mais do que natural, foi único e selvagem."



Incrível né??
Parabéns Gabi pela força e pela mulher que você é. Tenho certeza que você não imaginava ser capaz de tudo isso!! Daqui uns anos a Dália vai se orgulhar da mamãe que tem ao ler o seu relato!!!
E parabéns ao papai Felipe pelo companheiro que é!! Esteve presente dando suporte para a Gabi todo o tempo!! Vocês são lindos!!
Passar por essa experiência fortaleceu bastante essa família, não é mesmo??
Obrigada por contribuir para o Universo Mamis. Relatos assim ajudam outras mamães a verem que também são capazes!!
Espero ver vocês mais vezes por aqui...


